segunda-feira, 29 de junho de 2009

Anne sempre foi uma menina desencanada, dessas que mostra orgulhosa a sua estante de homens-objeto. Ela sim sabia como lidar com eles e calculava friamente os movimentos pra nao se envolver a ponto de se arrepender. Mediocre que brincava com o coracao dos outros, mas se achava no direito de faze-lo dado que por tanto tempo era isso que recebia em troca ao inves de amor. De fato, ninguem havia lhe entregado o coracao por inteiro ou se dado foi algo tao pequeno e despercebido que ela nao notou a seriedade da coisa. Entao brincava com as circunstancias, fazia deboche dos cliches da vida moderna. O que nao passava de uma forma de provar a si mesma que nao precisava daquela palhacada de 'eu te amo'. E nao precisava mesmo. Tudo que ela precisava era alguem pra dar um beijo caloroso de bom dia e boa educacao. Mas nao, o destino colocara no seu caminho esse tal de amor. E ela o amou. Por muitos anos pertenciam a ele seus olhos de esmeralda recem polida. Existia o amor, mas lhe faltava a compreesao e uma serie de sentimentos que tornam possivel o convivio. Entao era isso, nao era amor. Era uma paixao fulminante que aquecia os coracoes mas nao transparecia a sutileza nas atitudes. Enquanto eles praticavam suas condicoes de animais perante o mundo zelavam contratos calados. Um lia os olhos do outro na busca de correspondencia, o problema e a falta de habilidade humana para ler o subentendido. Era evidente. Improvavel mas evidente que as letras estavam embaralhadas. Nao era amor que estava escrito em tinta manchada, nao era nada. Era apenas um pedido de socorro da mediocridade, na busca de uma valvula de escape. E ele a salvara por alguns anos, ate que os coracoes se esfriaram de concessoes que machucavam o egoismo nosso de cada dia. E o contrato fechado no olhar foi desfeito na mesma medida pois todo caso termina na intensidade em que comecou. E esse fora seu medo desde o inicio. Mas depois de alguns tapas na cara, anne aprendeu a ser fria e calculista como todos os homens que conhecera. Foi quando se despiu dos sentimentos de vez. Se tornara uma maquina perfeita que nao sofre as espectativas de correspondencia, nem sequer sentia mais nada.Nada poderia abala-la. Nem mesmo o romantismo bobo que enxergava nas vontades sordidas. Nao acreditava mais no amor. Nem mesmo na massa amante da face da terra.Eram todos contratos calados assinados com mentiras.

segunda-feira, 22 de junho de 2009

Guerra silenciosa

Sempre tive um talento especial pra errar. Seja por esse meu mecanismo auto-sabotador que me persegue ou tomando decisoes erradas de olhos abertos. Mas nunca saio de uma viagem ilesa dos arranhoes. E, desde entao, construi um muro de pedra em volta de mim e me tornei prisioneira da minha propria mediocridade. E como arma de destruicao em massa eu usava a indiferenca. Como escudo eu mantinha distancia da intimidade. E aos poucos fui adaptando o meu forte a guerra. Foi quando eu percebi que do outro lado do muro nem todos os invasores queriam me derrotar. Mas a descoberta nao foi assim tao simples. Foram anos de guerra silenciosa que me levaram a esse estagio de calmaria mental. E naquela sexta-feira sem graca voce apareceu na minha porta, tocando a campahia com educacao, me desarmando devagar. Acostumada a toda violencia e torpor, me vi atonita diante da honestidade. E voce foi descongelando os muros que reinavam em mim, e conforme os tijolos caiam a dependencia foi reinando onipotente. E dela que eu sempre tive medo. A dependencia do que nem e seu de direito mata. Ou voce acha que Julieta morreu de que?!Ela era dependende do amor de Romeu, e so de pensar que nao mais o veria tratou de dar cabo de sua vida. Longe de mim me comparar a Julieta, mas penso sofrer o mesmo mal. Nao necessariamente amor desenfreado, mas da necessidade de afeto, a necessidade do outro. E eu me vejo assim. Completamente perdida nesses dias que nao te vejo, nem outro assunto ousa rondar minha mente. E nesse dia voce construiu um muro maior ao redor do meu, me protegendo de toda dinamite.

segunda-feira, 8 de junho de 2009

Psicanálise

- Eu bem que tentei. Tomei veneno, caminhei bêbada sobre a beirada do terraço de um prédio de trinta andares, deitei-me sobre pregos, comi pão mofado, engasguei com jujubas açucaradas. Tentei ser o pior que pude, mas minha vida sempre foi razoavelmente boa. Nunca vivi um amor proibido e avassalador, nunca passei uma noite na cadeia e mesmo fumando dez cigarros por dia há quinze anos, não estou nem perto de conseguir um tumor. Foram tantas tentativas de vicios, mas jogatina e drogas pesadas nunca foram o meu forte. Depois de alguns meses o máximo que consegui foi uma ida ao hospital por intoxicacao depois de fumar maconha estragada. E não pensem que apareci no hospital caminhando tranqüila pela porta da frente não. Estava curtindo a minha inanição na paz do meu cômodo mal cheiroso quando dois enfermeiros mal encarados vieram me salvar da minha mediocridade a caminho do hospital. Familiares dispostos a me manter sã bancavam aquela palhaçada. Sempre dei o azar de não dar azar, e meus anos sempre correram conspirando com minha sorte, mesmo nos momentos em que eu insistia em fazer tudo errado as coisas sempre acabaram bem para mim. Aliás, já começaram bem: nasci em família abonada, fui criança de passaporte e cursos de natação, inglês, ballet e teatro... enfim, qualquer um daria tudo para viver como eu sempre vivi. Enquanto eu daria tudo para ser como qualquer um. Tentei ser pobre, mas até sendo pobre eu ganhava dinheiro nas esmolas e crescia na vida; tentei ser bandida, mas a polícia nunca me pegava, eu sempre consegui escapar da lei; tentei ser boêmia e passar o resto dos meus anos me auto-destruindo e fazendo arte, mas minha arte era demasiado boa e então os museus me adotaram como a “nova arte em persona”, o que não me permitiu o sonho de morrer cedo e no anonimato. Mudei de cidade e emprego tantas vezes que perdi a conta. Passei por cada sufoco, mas no final, me dei bem em todos. Por último, fingi sofrer uma forte depressão, e passei dois meses sem tomar banho ou sol, comer direito e falar com alguém. Mas cansei de bajulações e de um dia pro outro me curei.
-Lamento senhorita Stenhagem, mas devo informá-la que seu problema trata-se de felicidade crônica.